quarta-feira, 25 de junho de 2008

BOMBINHAS



A bombinha de São João, jogada no palco pelo menino, assustou a cantora. Em pânico, agarrou-se ao segurança, que a tomou nos braços e carregou-a até o camarim. Era o primeiro contato físico entre ambos, nascendo, dali, o romance que levou, meses depois, o marido e empresário dela a matá-la e suicidar-se. Era a isso a que a mãe do menino se referia quando o alertava: " pára de jogar bombinhas senão ainda vai causar uma tragédia?"

segunda-feira, 23 de junho de 2008

DESENCONTRO




Em final de mandato ( deixaria o governo dali a uma semana), o presidente esteve em sua cidade natal, que não visitava havia 15 anos. Atendia às exigências da agenda de despedidas elaborada pela assessoria de marketing. Nem durante, nem após o discurso no palanque da praça, viu, do outro lado da avenida, meio apartado da multidão, Wanderley, o carrinheiro, companheiro de antigas jornadas políticas ( quantas vezes não juraram, juntos, combater e acabar com as injustiças sociais?) . Acabou de discursar , foi levado, às pressas, para o aeroporto, rumo a outro compromisso. Wanderley também não o viu, preocupado que estava em recolher, antes que outros carrinheiros o fizessem, a sucata deixada pela multidão.

O JACARÉ



- Que prédio enorme!Nossa, veja quanto carro! Que ponte grande! Aquele trem vai entrar debaixo da terra?
Saída do pantanal matogrossense pela primeira vez, para visitar a irmã, ela não conseguia conter-se ante as surpresas da cidade grande. Os demais passageiros do ônibus olhavam-na, divertidos, ou com expressões condescendentes. O cunhado, que fora pegá-la na rodoviária, não escondia certo constrangimento. Então, o coletivo parou. Carros de emissoras de TV , viaturas policiais e dos bombeiros atravancavam o trânsito. O motivo era o aparecimento de um jacaré no poluído córrego entre as pistas. Todos desceram para ver as tentativas de resgate do animal. O cunhado chamou-a para ver também, mas ela resolveu permanecer no ônibus."Que graça tem um jacaré?”, pensou.

segunda-feira, 16 de junho de 2008

PAR IDEAL


Ela, porque ficara com uma perna menor do que a outra e um braço imobilizado, o marido passou a rejeitar, até que se separaram. Ele, porque ficou com toda a face esquerda transformada em uma cicatriz, além de cego de um olho, teve seu noivado desfeito. Formariam um par ideal, mas a única ocasião em que estiveram juntos, no mesmo lugar e momento, fora no ônibus acidentado.

PARA E SEGUE O ÕNIBUS


PAra o ônibus. O homem que conferia um bilhete da loteria, levantou-se de repente, desceu e dirigiu-se correndo ao telefone público. Levino, no banco de trás, cutucou o colega ao lado.
- Vamos atrás do cara. Aposto que acertou os jogos e está avisando alguém da família . Tomamos o bilhete dele e estamos feitos.
Após dizer um palavrão e chamá-lo de "maluco delirante", o colega virou-se e continuou o cochilo interrompido.
Segue o ônibus. Some da vista o homem que , no orelhão, pede à esposa para vir pegá-lo, de táxi, naquele local. Ganhara na Megasena e tinha medo de ficar andando por aí com o bilhete premiado.

J.A.



Todos os prédios daquela rua, feitos um século atrás, traziam, escrito em seus frontispícios, o ano de construção , uma prática dos mestres construtores da época.Aquele, porém, ao lado da data, MCMXX, mostrava também as iniciais J. A. Desde menino, aquilo o intrigava e, adulto, com posses e tempo para isso, resolveu identificar o homem que,em tempos idos, recusara-se, pelo menos parcialmente, a ficar anônimo. Gastou anos e dinheiro na investigação para descobrir, ao final, que se tratava de uma empresa: Jardim de Alá.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

INCERTEZAS



Naquela noite, surpreenderam-se, no mesmo motel, com os respectivos amantes.Usaram de igual justificativa:
- Ele ( ela) é só meu ( minha) amigo ( amiga). Acompanhou-me até aqui apenas para servir de testemunha de seu adultério.
Até hoje, nenhum dos dois tem certeza da verdade.

DAVI E GOLIAS



Desde criança fora grande , forte e feio.Três vezes mais do que a média. Jamais gostou de agredir , tampouco precisou fugir de alguém. Tamanho, força e feiúra foram-lhe ataque e defesa na vida. Divertia-se com o medo provocado por seus saltos, urros e caretas. Adulto,no exército de seu povo, tornou-se uma lenda , à qual os inimigos, atemorizados, rendiam-se sem lutar. Até que um dia um garoto, destemido, e a quem não pretendia fazer nenhum mal, matou-o com uma pedrada.