Quando
o grande ator brasileiro Tarcísio Roberto sofreu o derrame , eu estava na
Italia, cumprindo contrato com uma companhia cênica de lá. Só voltei ao Brasil
três meses depois e resolvi visitá-lo em
sua casa.
Não
éramos amigos; tivemos poucos contatos, mas não poderia deixar de, como colega,
prestar-lhe pessoalmente minha solidariedade.Antes de levar-me até ele,sua
mulher pediu que não falasse sobre teatro. Compreendi. O derrame o deixara impossibilitado
para atuar. Seria um assunto traumático.
Conversamos
sobre amenidades.Notei que, a não ser por ligeira paralisia no lado esquerdo do
rosto e dificuldade para pronunciar certas
palavras, a moléstia não o deixara com sequelas físicas muito acentuadas.
-
Até outro dia. Espero vê-lo,novamente, em ação- disse-lhe, ao me despedir.
Ao ouvir a palavra ação, seus
olhos brilharam. Levantou-se da cadeira.
- Sim. Fui Júlio Cesar e Henrique VIII, de
Shakespeare! Fui Édipo Rei, de Sófocles. Fui Ulysses, de Homero!Eu sou..
Calou-se. Sentou-se,
as duas mãos espalmadas no rosto e cabeça baixa. Sua
esposa , com um sinal,pediu que nos afastássemos. À caminho do portão,
explicou-me:
-
É por isso que evitamos dizer qualquer coisa que o faça lembrar-se do teatro. Sua
maior angústia não é a impossibilidade de representar. É lembrar-se de todos os
personagens que foi e não recordar quem
ele é.
Nenhum comentário:
Postar um comentário